Breve resenha sobre a corrupção e os Tribunais de Conta


Desde garoto, quando comecei a tentar entender o universo político tupiniquim, lá pelos 14 anos de idade, sempre tentei traçar um padrão típico de corrupção, vale dizer, quais os sinais característicos        , simbólicos, que demonstrem irregularidades nas administrações do Poder Executivo.
            Nessa busca, adiante um pouco mais detalhada, consegui descobrir o dogma dos Tribunais de Conta. Explico: na forma como eles (diria todos eles) atuam hoje, penso que não contribuem significativamente (ou em nada contribuem) para o fim da corrupção.
Vou explicar o motivo, mas primeiro farei uma breve resenha sobre dois aspectos desse padrão típico de corrupção que encontrei nessa minha curta e acanhada vida.
Pelo que vi e pouco entendi a estratégia habitualmente adotada pelos grupos bandoleiros (não vou citar nomes aqui, se a curiosidade apertar me perguntem pessoalmente) que infestam as administrações do Poder Executivo (mormente as prefeituras) para desviar recursos públicos se dá por meio do uso de notas fiscais fictícias (ou frias), que normalmente descriminam serviços não prestados ou produtos não entregues.
Eis o primeiro aspecto.
Um detalhe importante e ridículo (que revela inclusive amadorismo dos fraudadores) é a existência na contabilidade das repartições públicas de notas fiscais de empresas diferentes, mas evidentemente impressas com o mesmo layout, diagramação, características, defeitos gráficos, etc.
Outro detalhe igualmente importante é o excesso de notas fiscais próximas a 10% do limite do valor máximo para a licitação denominada carta convite, uma modalidade menos burocrática. Vamos considerar que o valor máximo para a utilização da licitação carta convite seja R$ 100.000,00. Após esse limite é obrigatória licitação em uma modalidade mais complexa e exigente, a tomada de preços. Serviços e compras com valor de até 10% do limite de R$ 100.000,00, ou seja, R$ 10.000,00 (dez mil), estão desobrigados de licitação. Assim, quando há excessivo número de notas próximas a R$ 10.000,00 há indícios de corrupção.
Notas do mesmo valor ou de valores próximos que se repetem todos os meses também podem representar um ardil para partilhar os frutos da fraude: a quantia de uma nota fria vai para o próprio fornecedor da nota e a outra quantia à corja corrupta.
A deliberada falta de controle no estoque das repartições públicas, de modo a impossibilitar a apuração do movimento de materiais de consumo, é outro traço de fraude que ajuda a esconder a excessiva emissão de notas frias. Notas preenchidas com quantidades de produtos muito superiores àqueles entregues e com informações vagas também fazem parte desse panorama.
A promoção de festas públicas para acobertar desvios de recursos também ajuda na circulação de notas frias. Algumas empresas de eventos, pela própria natureza dos serviços que prestam, têm sido grandes fornecedoras de notas fiscais fictícias. Afinal, é notadamente difícil checar a veracidade dos cachês dos artistas e da comissão que cabe aos agentes organizadores.
Pois bem, o segundo aspecto que observei é a existência de fornecedores profissionais de notas viciadas. A burla normalmente é realizada através das chamadas empresas fantasmas, que inexistem física e até juridicamente, mas também pode ser levada a cabo por empresa dita normal, acaso haja conluio com seus administradores.
Detalhe para as empresas constituídas às vésperas do início de um novo mandato, que passarão a fornecer para os entes que integram o Poder Executivo. Isso sem mencionar o estoque de empresas fantasmas prontas para serem utilizadas. Importante considerar a possibilidade dos sócios serem meros ‘laranjas’ ou ‘testas de ferro’, pessoas que emprestam voluntária ou involuntariamente seus nomes para o esquema corrupto.
Outro detalhe é o excesso de licitações carta convite, que normalmente envolve várias empresas fantasmas. Compras ou serviços de um mesmo fornecedor, sem rodízio eventual, também revela irregularidades. Um exame não tão minucioso pode revelar propostas de diferentes empresas impressas em uma mesma máquina.
Mais um indício de trapaça é a empresa possuir apenas o ente público como cliente, o que denota ter sido ela montada ou preparada especificamente para esse fim. Notas fiscais seqüenciais representam o amadorismo deste tipo fraude. Já os profissionais utilizam outras empresas frias para mascarar a clientela.
Para se evitar o acesso às notas frias, também há a forja de incêndios e roubos, para impedir o acesso das autoridades aos documentos fictícios.
Mas, enfim, aonde se encaixa o dogma dos Tribunais de Contas?
Os Tribunais de Conta, ordinariamente, só verificam os aspectos formais das despesas. O órgão fiscalizador não entra no mérito da frieza da nota fiscal contabilizada ou da fantasmagoria da empresa emissora da nota, ou até mesmo se o procedimento licitatório fora montado e conduzido corretamente. Referidas questões somente são alvos dos Tribunais de Conta quando instados especificamente para tanto, pelos legislativos a quem estão subordinados.
Eles, ao aprovarem as contas de determinado ente, passam atestado de idoneidade a um grande numero de falcatruas, eximindo publicamente de culpa aqueles que se utilizaram dos ardis. Assim, na forma com atuam hoje, os Tribunais de Conta não contribuem para o fim da corrupção, pelo contrário, também são palco de artimanhas, como nas recentes denúncias.

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